26.3.11

Como se faz um livro

"Como se faz um livro. Esta talvez seja a forma mais sucinta de descrever Afonso e o Livro, mas é incompleta e redutora. Acrescente-se por isso outra ideia: como se cria um leitor. Assim é mais justo. Afonso sabia que “gostava muito, muito de um livro”, mas ainda não o tinha encontrado – nem podia. O livro que procurava não existia – ainda. O rapaz há-de conseguir criá-lo com a ajuda de todos os interveniente no processo de produção da obra: do autor ao revisor, passando pela ilustração, paginação e produção final. E tornar-se-á leitor. Uma articulação feliz entre texto e imagem facilita e entusiasma a leitura de uma história bem imaginada. A lembrar que há um livro especial para cada um de nós. Crianças ou (já) não."

Está no Público e no blogue Letra Pequena. Pela Rita Pimenta. 

25.3.11

Dois dias na Beira

Devido a um novo convite da Livraria Jardim, da Guarda, o Afonso viajou até ao interior de Portugal, desta vez para visitar escolas em Manteigas, Teixoso e Orjais. Quatro horas de viagem no final de tarde e início de noite até chegar a uma terra que foi esquecida por todos e que luta, cheia de limitações, para se manter viva. Durante essas quatro horas, pensei muitas vezes na falácia de estar de visita ao “país real”. Mas não.  O interior é, cada vez mais, o país irreal, esquecido, ignorado. Levar um pouco, por muito pouco que seja, às crianças daqueles lugares é um imperativo. Pouco mediático, mas seguramente muito efectivo.

Manteigas

Comecei o dia na EB1 de Manteigas, conhecendo um grupo de meninos dos 1º e 2º ano, para além dos meninos da Pré-Primária. Também vieram alguns meninos da aldeia de Sameiro e fui um deles, o Duarte, quem tinha várias dúvidas sobre as ilustrações do Afonso, às quais tive o maior gosto de responder. O grande problema era o facto de alguns dos bonecos aparecerem desenhados sem pernas, ao que tive que responder que se tratava de um desafio à imaginação deles. No fundo, o facto de não estar ali parte do desenho, dava-lhes total liberdade para imaginarem o que quisessem. Da parte da tarde, as turmas do 3º e 4º ano levaram a conversa do Afonso para o Futebol e houve discussão sobre quem era o melhor jogador do momento. Um dos meninos, que disse ser primo do Carlos Martins, tinha um favorito inesperado. Questões de família.

Antes da sair da EB1 ainda houve tempo para plantar um azevinho, assinalando o Dia Mundial da Árvore. Lemos um poema do Jorge de Sousa Braga e era já hora de seguir viagem para a EB2+3 de Manteigas, onde um grupo de alunos e professores me esperava para falar de poesia. Mudar de registo, em poucos minutos, não é fácil. Afinal estava perante um grupo de adolescentes de quem pouco sabia. A professora Eulália Pereira, que me acompanhou durante o dia, tinha-me incentivado a falar de um dos meus novos poemas, chamado “O pastor a solidão”. Talvez tenha exigido demasiado deles, embora tenham mantido o silêncio e a atenção durante a minha conversa. Talvez lá tenha ficado alguma coisa. Talvez.

Agora, se visitas às escolas não vos levarem a Manteigas, há uma coisa que deverá colocar esta vila no vosso mapa. Procurem a Albergaria Berne e provem o prato de Entrecosto e Enchidos com Migas de Feijoca. Acho que o nome diz tudo. Vá lá, todos a Manteigas.

Teixoso e Orjais

Quinta-feira foi dia de ir para perto da Covilhã, começando o dia na EB1 de Teixoso. Por ali, encontrei algumas grandes ideias sobre o trabalho dos escritores. Um dos meninos definiu, maravilhosamente, o trabalho da escrita, dizendo que é preciso fazer com que a história “soe bem”. Outra das meninas, anunciada por uma colega como a “melhor ilustradora” da escola, ficou intrigada com o facto de eu ser de Santa Cruz, dizendo que o costume é “os escritores serem de Lisboa e nunca virem ao Teixoso”. Por ali também fiquei a conhecer uma candidata a escritora, que até já escreveu histórias “de três páginas daqueles cadernos grandes”. Algo me diz que, por ali, há muita ideia bonita a fervilhar.


Depois do almoço, foi até Orjais, onde tive uma recepção em grande, com os meninos a correrem pelo recreio para me aplaudirem. Afinal, era mesmo a primeira vez que um escritor vinha até aquela Escola. As professoras Paula e Goreti fazem um trabalho espectacular com os miúdos, lutando contra as carências do lugar e da ausência de biblioteca na escola. Os meninos são incentivados à leitura e têm por hábito fazer fichas de leituras. A festa era tão grande que havia um enorme Afonso na parede, rodeado de muitos trabalhos dos alunos da escola, e, vim a descobrir mais tarde, até havia bolo.

Alguns dos meninos trouxeram uma câmara de filmar improvisada, de cartão, fazendo-me uma entrevista no final. Também estiveram presentes os meninos da escola de Vale Formoso e havia imensas perguntas sobre o livro e a escrita. Também aproveitei para ler a história em voz alta, para que os meninos percebessem a entoação que o escritor dá às palavras que escreve. Ainda houve tempo para uma sessão com os meninos do Jardim de Infância, um grupinho muito interessado e completamente ligado à corrente. A Raquel não esteve nada de acordo comigo quando eu lhes disse que os escritores passam despercebidos na rua. Afinal, ela mora em frente à escola, e se eu passasse por ali, ela saberia logo quem eu era. Já mesmo no fim da visita, a Beatriz achou que a história que eu ando a preparar, sobre um menino chamado Pedro, ainda não estava grande coisa. “Só isso?” perguntou ela um tanto indignada. A verdade é que vou ter que me esforçar mais para que a história comece a soar bem…

Antes de voltar a casa, não me posso esquecer de dizer como o bolo estava delicioso. E, ao que me parece, não restou nem um pedacinho para contar a história.


18.3.11

O Afonso no Porto

No início desta semana, o Afonso viajou até ao Porto.

A primeira paragem foi o Colégio Efanor, em Senhora da Hora, onde encontrei dois grupos. No primeiro grupo, com meninos de 4 e 5 anos, falámos muito sobre como se fazem os livros e que ideias são precisas para conseguir escrever um livro inteiro. Ficámos a saber que existem revisores nos livros, para além dos comboios, e também que o Afonso terá sobrevoado a floresta, não se desse o caso de vir a encontrar o lobo mau.
O segundo grupo eram meninos do 3º e 4º ano, logo a conversa foi bastante mais adulta. Aqui, os meninos quiseram saber o que se passa numa gráfica, que tipo de empresas tem tantos trabalhadores para fazer um livro, para além de eu ter lido a história de fio a pavio em voz alta (pela primeira vez desde que o livro saiu!). Uma parte muito interessante da conversa foi quando um dos meninos lembrou que tinha um livro com muitos erros ortográficos. Então, discutimos as várias razões para que isso tivesse acontecido. Uma troca de ficheiros na gráfica, um revisor distraído, talvez um revisor inexistente e, a minha preferida, talvez o livro fosse mesmo assim, com erros, à espera que os meninos os pudessem corrigir.

No final da tarde fui convidado para ir até ao Porto Canal, participar no programa “porto alive” onde falei do Afonso e do que iria acontecer no dia seguinte.

Na terça-feira de manhã estive no Auditório da Biblioteca Municipal do Porto, na Rua de São Lázaro, para me encontrar com os meninos do Abrigo dos Pequeninos. Um dos pais tinha-me convidado para os encontrar e eles vinham ansiosos por conhecer o escritor e por estarem na sala dos “grandes”. Os meninos conheciam já a história do Afonso e tinham-na bem fresca na memória, visto que foram eles que me ajudaram a lembrar de todas as aventuras que acontecem no livro. No final, também me falaram dos seus livros preferidos (o Ruca, do Batman, dos Dinossauros, do Homem Aranha vermelho e do Homem Aranha preto!), e quiseram saber mais coisas sobre o tamanho das letras.

Voltei a casa muito contente por ter feito mais todos estes amigos. Tempo ainda para agradecer à Livraria Index que apoiou todos estes encontros com os mais pequenos. Agora, é tempo de voltar a preparar as malas, já que na próxima semana o destino é Manteigas e Teixoso. Até já!

17.3.11

A tentação da marquise 4

Já não há ternura. Não. Já não há sequer uma sensação de pertença. O laço desfez-se. Agora caminhamos juntos porque queremos estar juntos, nada nos prende a este lugar mais que a algum outro. O que podemos fazer por isto, continuamos a fazer. Mas nem uma nova construção lhe escapa. Está demasiado impregnado nas parcas opções que optaram ver. Se nos virem pelas costas, não pensem que desistimos. Apenas nos alistámos no que está para lá do visível. Para lá da tentação da marquise. 

16.3.11

A tentação da marquise 3

Falta saber, falta. Falta sobretudo pensar quando se lê – mesmo que não sejam letras aquilo que nos entra pelos olhos. Falta perceber o que conduz os nossos actos. Falta perceber o que dizemos, quando o dizemos. Falta perceber o quanto tempo permanecemos calados. Falta, ainda mais que tudo, perceber quando é importante manter a varanda, em lugar de optar pela marquise, apenas porque é inverno, e o vento, uma salinha, algo assim, faz tanta falta.

15.3.11

A tentação da marquise 2

Nunca pensar como um grupo, mesmo quando é em grupo que estamos. Nunca pensar que as coisas têm consequências, deixam marcas. Viver como se tudo fosse apenas uma festa. Apontar os dedos a quem escolhe outro caminho. “Se estamos aqui, porque não somos todos o mesmo?” Ninguém escapa à tentação de normalizar. As sensações, as descobertas. Viver como se tudo fosse apenas o hoje.

14.3.11

A tentação da marquise 1

Nem uma nova construção lhe escapa. A casa erguida em frente ao mar e, ao fim de uns meses de habitação, a varanda fechada, procura de sossego de costas para a sua própria natureza. Nem uma nova construção lhe escapa, nem a instrução, nem a humanidade. Todas as preocupações são, eventualmente, particulares. A tentação da marquise, o meu país. 

13.3.11

Ainda em Março...

Dia 14: Matosinhos*

Dia 15: Porto
Biblioteca Municipal de S. Lázaro
Início: 10h15
Entrada livre

Dia 23: Manteigas*

Dia 24: Teixoso*


*sessões em escolas, exclusivamente para os alunos das mesmas 

11.3.11

Visita à Escola João de Deus em Coimbra

A convite da Livraria de José Almeida Gomes, fui até à Escola João de Deus fazer várias sessões de apresentação do “Afonso e o Livro”, para meninos do Jardim da Escola e do Ensino Básico. Foram três sessões muito divertidas, sempre com a sala polivalente da escola cheia de crianças, cada uma delas com perguntas e dúvidas bem pertinentes sobre a história do Afonso e o que significa ser escritor.

As crianças ficaram logo muito impressionadas por eu ter demorado duas horas a chegar à escola. Mas alguns deles já tinham visitado a Praia de Santa Cruz. Quiseram saber tudo sobre como se fazem os livros. Tinham muitas dúvidas sobre a imaginação necessária para se escrever uma história. Queriam saber se eu gostava do que fazia e se me via a fazer outras coisas. E estavam em pulgas para conhecer mais histórias que se podem encontrar em livros.

Muito engraçado foi também conversar com um menino que estava seguro de que só existem dois Lourenços no mundo, “eu e um presidente”, disse ele. Quando eu lhe disse que conhecia um outro Lourenço que não era ele, nem presidente, ele teve resposta rápida: “então somos três”. Encontrei também alguns Afonsos muito contentes por haver um livro com o nome deles, e ainda outros meninos e meninas que me deram sugestões para outros nomes a utilizar nos próximos livros.

Também tenho que falar de uma Catarina. A Catarina é uma menina muito tagarela, que não parava de falar e espreitar quando estava na fila dos autógrafos. Antes da vez dela, veio um João pedir um autógrafo e eu disse-lhe que tinha um irmão com o nome dele. Depois ela, e quando eu lhe disse que tinha uma irmã com o mesmo nome dela, ela riu-se e disse-me: “tens tantos irmãos!”

Para acabar tenho que falar da oferta que me fizeram. Um livro chamado “Caldo de Poesia”, com poemas de vários alunos do 4º ano. O Martim foi o porta-voz da turma e ofereceu-se para ler um dos poemas, nem mais nem menos, o seu. Deixo aqui um excerto desse poema, enquanto vou preparando as malas para mais uma viagem com o Afonso!

“Os Portugueses tinham um sonho
De a Índia descobrir
E tiveram de tentar
Para esse fim atingir”

3.3.11

Corrente

Aprendi que os dias não sempre iguais em todo o lado. Que uma tarde ou uma manhã podem ter outras roupagens. Que o pesado pode ser leve e o leve pode ser tudo. Aprendi que a distância tudo diferencia. Delimitas as importâncias de uma maneira totalmente diferente. Aprendi tudo isso. Aprendi.

2.3.11

Cresce, rapaz 3

Fico realmente satisfeito com o teu pânico, é sempre nestes momentos que acabamos por mudar de caminhos já desenhados e encontramos novas formas de sermos felizes. Fico realmente satisfeito com a tua desorientação, porque confio em ti e sei perfeitamente que podes pegar nesse teu corpo e alimentá-lo de um outro espírito. Fico realmente satisfeito por teres passado por aqui. De alguma forma nunca dita, sempre soubeste que eu ia aqui estar. 

1.3.11

Cresce, rapaz 2

A fuga é remédio para tudo. Estás mal, mudas-te. Frágil, corres. Assustado, escondes-te. Dói-te algo, ignoras. A fuga é remédio para tudo, é remédio para nada. Apenas consegues que o tempo fique parado, à tua espera numa outra esquina inesperada da vida. Resta-te enfrentar. Mas enfrentar para quê, pensas tu.