24.1.11

Seremos poucos?

Diz a sabedoria popular que "palavras leva-as o vento". Talvez lutemos contra isso quando insistimos em grafá-las no papel, imprimindo-as em livros que, esperamos, fiquem para a posteridade. No entanto, o próprio futuro prometido parece escasso quando, à nossa volta, exista uma leve sensação de fragilidade no reconhecimento de quem escreve. 

O escritor é um trabalhador do silêncio, existe na reclusão de um exercício solitário, longe dos destinatários da sua mensagem. A própria leitura é um trabalho individual, assertivamente afastado do processo da escrita. Estamos assim nos pólos, escritores e respectivos leitores, existentes numa comunicação que, essa sim, leva-a o vento, tão dependente da imaginação de cada um ela subsiste. 

O momento de encontro do escritor com os seus leitores são os lançamentos, as apresentações dos livros. Mas, quem sabe o vento, quem sabe o frio, nos deixa também aí tão sós, tão afastados da realidade que acreditávamos ter sido capazes de grafar no livro. Os leitores presentes são leitores do passado, ainda não leram o livro que já foi escrito, e toda o encontro se baseia noutros valores que não os da reunião à volta de um texto. 

Ainda assim, os poucos que surgem, têm palavras que ganham contornos mais fortes que a brisa, talvez porque eles representem algo mais do que os leitores que são: a amizade, o respeito, o amor. E fica o escritor agarrado a essas palavras numa noite bem fria, onde se volta a disfarçar de homem diluído na multidão. 

Seremos poucos, então? Poucos para segurar a possibilidade do livro? Poucos para marcar alguém fora do círculo de proximidade? Seremos poucos os que sentem a necessidade de alguma presença? Ou é mesmo melhor continuar a relativizar as coisas, a ignorar as importâncias, a desviar o olhar das pequenas promessas, das ténues ambições, vivendo disfarçados de homem com casaco a sair cedo de casa para comprar o jornal? Sem tristeza alguma, eu sei que sim. Eu sei que sim.